Investir em uma empresa que almeja introduzir um novo produto/serviço na vida de potenciais consumidores é uma incerteza formidável. Não se trata apenas do risco do produto ser aceito ou não pelo mercado, mas também da velocidade e intensidade com a qual isso poderá vir a acontecer. Essas variáveis definem a sobrevivência ou morte de uma startup, assim como a quantia de dinheiro necessária para o crescimento do negócio e o potencial retorno que este deve trazer para seus sócios.
É isso que o livro de Geoffrey Moore, Atravessando o Abismo (Crossing the Chasm), aborda. Aliás, leitura obrigatória (considerado uma bíblia no Vale do Silício) para qualquer profissional (empreendedor ou executivo) que almeja montar estratégias de marketing para produtos inovadores.
Escrito em 1999, porém mais atual hoje do que nunca, o livro segmenta o mercado em diferentes grupos de consumidores baseado nas suas características de adoção de novos produtos. Cada segmento deve ser atacado sequencialmente e ocupado como trincheiras. Após cada território conquistado, este deve ser usado como plataforma de ataque do próximo, com ajustes na estratégia e apoio dos formadores de opinião.
Em linhas gerais, o ciclo de adoção de uma inovação separa a população de consumidores em 5 grupos, de acordo com seu posicionamento frente às novas tecnologias:
Inovadores – são os “apaixonados” pelo novo, também conhecidos como os techies.Para eles a tecnologia é um fim em si mesmo, não se importam com bugs e normalmente dão muitos feedbacks.Representam o primeiro e mais fácil alvo de consumidores.
EarlyAdopters – Os visionários, aqueles que enxergam inovações como uma oportunidade para obter vantagem competitiva, tem alta propensão ao risco e estão dispostos a apostar no produto não comprovado. A conquista deste segmento normalmente representa o sucesso ou fracasso de um produto.
EarlyMajority (a primeira maioria) – São os pragmáticos, aqueles que aderem rapidamente quando os diferenciais de um novo produto são validados. Não colhem os mesmos frutos daqueles que se arriscaram antes, mas entendem que existe uma vantagem (ou obrigação) em adotar uma nova tecnologia. A conquista desta trincheira normalmente diferencia um produto de sucesso moderado de um blockbuster.
Atrasados – Os conservadores, aqueles que costumam ser sensíveis a preço e não conseguem compreender as vantagens trazidas pela nova tecnologia, gostam de adotar soluções que não lhes dão trabalho, integrem facilmente com seus negócios e não representem ameaças aos legados proprietários. Este mercado já representa a fase final do ciclo de vida e um produto, normalmente enfrentando novos concorrentes com soluções melhores mas menos estabelecidas.
Retardatários – São os céticos,não acreditam nas novas tecnologias e tendem a ser saudosistas (i.e. argumentam ferozmente na superioridade do vinil).
Segue abaixo a distribuição destes grupos dentre a população de consumidores. Interessante observar duas ”falhas”e um “abismo” (separando um seleto grupo de clientes de um mercado de volume) que sinalizam desafios importantes na evolução da adoção de uma tecnologia pelo mercado.
Vamos analisar primeiro as duas “falhas”. A primeira se dá pela diferença de motivos que os inovadores e os earlyadopters aderem às novas tecnologias: enquanto o primeiro grupo gosta de experimentar e tentar algo novo por que é interessante, legal e diferente; o segundo precisa ver um objetivo específico no uso da tecnologia. A segunda “falha” se dá na adoção da tecnologia pela primeira maioria e os atrasados. O segundo grupo normalmente não está disposto a se tornar tecnologicamente apto para absorver novos recursos, o que causa uma lacuna entre a adoção da maioria e aqueles mais conservadores, que só irão abraçar uma nova tecnologia quando for consideravelmente fácil fazê-lo, sem esforços de mudança ou a necessidade de novas habilidades.
Finalmente chegamos ao abismo, o grande desafio de crescimento para qualquer inovação. Como saltar de um pequeno grupo de entusiastas para a massa crítica do mercado, criar volume, e entrar para o seleto time de game changers? Como romper a barreira dos early adopters e fazer parte da massa?
Novamente, é importante entender a diferença de comportamentos entre os dois grupos de consumidores (early adopters e early majority):enquanto o primeiro é mais arrojado, antenado e entende que bugs e fracassos fazem parte do jogo, o segundo quer algo evolutivo, uma transição suave, quer aperfeiçoar produtos e processos e não tolera problemas.
A solução apontada por Geoffrey Moore em seu livro é uma estratégia “Dia-D”, inspirada na manhã de 6 de Junho de 1944, quando as tropas aliadas focaram todos seus esforços nas praias da Normandia, França, para conseguir romper as barreiras Nazistas. Esta estratégia para cruzar o abismo consiste em quatro macro-táticas
Mirar o ponto de ataque – aqui segmentação é a palavra-chave: foque todos seus esforços para se tornar um peixe grande em um lago pequeno. Para isso é necessário entender os consumidores, suas razões para comprar seu produto, definir um segmento onde há boas chances de vitória e que permitirá o avanço para novos segmentos;
Montar a força de invasão – uma vez definido o segmento, você precisa estar com um produto “matador”, que solucione os problemas desses clientes e ataque diretamente a razão pela qual eles comprariam seu produto. Foque em alianças e parcerias para fortalecer seu produto e procure quem pode abrir portas essenciais ao seu negócio (mapeie distribuidores, fabricantes de produtos complementares, etc.);
Definir a batalha – meça a competição e se posicione. Foque em ser o líder do segmento, seja claro em quem irá usar seu produto, para que e por que ele é melhor que a competição.
Lançar a invasão! – o foco agora é preço e distribuição, monte sua estratégia comercial e conquiste a praia! Digo, o segmento escolhido…
Tão importante quanto inovar é saber como levar sua inovação ao mercado. O cemitério está repleto de grandes inovações que não souberam evangelizar seus consumidores. Um erro frequente está em não entender o ciclo de adoção e ajustar a estratégia para isto. Espero que com este texto, baseado no mestre Geoffrey Moore, tenha auxiliado você, empreendedor, a criar uma estratégia vencedora rumo ao sucesso nesta guerra da inovação.
Fonte: SP Ventures